Eméritos 2024: Celuta Sales Alviano
Professora do IMPG destacou-se como referência internacional na pesquisa de fungos patogênicos e superfícies microbianas

Em 2024, seis docentes do Centro de Ciências da Saúde (CCS) receberam o título de professor emérito. A fim de comemorar a honraria e celebrar a história desses profissionais, o CCS preparou uma série de perfis que contam a trajetória dos professores recém-eméritos na instituição e sua dedicação à ciência e à educação.
O último perfil da série é dedicado à memória da professora Celuta Sales Alviano, que dedicou mais de 50 anos de sua carreira ao estudo da Microbiologia, com destaque para a pesquisa de superfícies de microrganismos e fungos patogênicos. A trajetória da docente é marcada pela excelência acadêmica e científica, além de um imenso compromisso com a formação de novas gerações de pesquisadores. Celuta nos deixou em janeiro deste ano, mas segue sendo uma referência na Ciência e na Universidade.
Celuta Alviano iniciou sua jornada acadêmica na Universidade Federal de Sergipe (UFS), onde obteve sua graduação em Química Industrial em 1969. Mudou-se para o Rio de Janeiro e completou seu mestrado (1973) e doutorado (1978) no Instituto de Microbiologia Paulo de Góes (IMPG) da UFRJ. Sua carreira docente na Universidade começou ainda durante o mestrado, com uma contratação como auxiliar de ensino, e foi progressivamente consolidada até se tornar professora titular, em 1998. Em 2007, recebeu o título de professora honoris causa pela UFS por sua contribuição no avanço das pesquisas realizadas na instituição. Já em 2022, Celuta se aposentou, mas continuou a atuar como professora colaboradora voluntária, evidenciando seu amor e dedicação contínuos à instituição. Em 2024, a UFRJ lhe concedeu o título de professora emérita.
Além de sua contribuição científica e educacional, Celuta deixou outro grande legado para a Universidade: sua filha. Daniela Alviano hoje é professora do IMPG e chefia o Departamento de Microbiologia Geral, como sua mãe fez por tantos anos. Ela conta que cresceu com o exemplo de uma mulher forte, apaixonada pelo seu trabalho e que também se dedicava enormemente à família. Para Daniela, foi essa força que abriu caminho e inspirou não só ela, mas muitas outras mulheres que tiveram a docente como fonte de inspiração.
“Ela nunca deixou de ser a mãe que se dedicava ao trabalho, e também se dedicava aos filhos. Então, isso tudo fez com que eu visse na minha mãe a possibilidade de fazer tudo”, lembra Daniela.
Ao longo de sua carreira como pesquisadora, Celuta foi pioneira no estudo de superfícies de fungos, especialmente na análise de ácido siálico, um campo inovador na Microbiologia na época. Sua linha de pesquisa foi fundamental não apenas para o avanço do conhecimento nessa área, mas também consolidou seu nome como uma referência internacional. Com mais de 250 artigos publicados, três capítulos de livros e uma patente, ela acumulou uma vasta produção científica que gerou mais de 12.000 citações, reforçando sua relevância no cenário acadêmico.
“Celuta foi uma inspiração. Visionária na área de Micologia, ela desbravou um campo que, nas décadas de 1990 e 2000, ainda dava seus primeiros passos. Hoje, a Micologia se expandiu e a relevância global das infecções causadas por esses agentes microbianos é amplamente reconhecida”, conta André Santos, professor do IMPG.
Além de sua dedicação acadêmica, Celuta teve ativa participação administrativa em comissões de grande importância, tanto na UFRJ quanto em agências de fomento, como o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj). Sua habilidade em articular recursos e sua visão estratégica foram fundamentais para o avanço de seu grupo de pesquisa e para o fortalecimento da universidade.
“Sua participação nas mais diversas comissões na UFRJ, e extramuros, consolidou o respeito ao IMPG, que atualmente é reconhecido por sua excelência acadêmica por toda a comunidade científica brasileira e também internacionalmente. Sua capacidade gestora contribuiu e continua contribuindo para o avanço do Instituto”, afirma Luciana da Costa, professora e atual diretora do IMPG.
Daniela enfatiza que a presença da mãe nesses espaços também era um forte símbolo de resistência feminina, já que não era comum que mulheres fizessem parte de comissões na época.
“Ela foi chefe de departamento por mais de 10 anos. Foi representante na Capes, no CNPq, e eu perdi as contas da quantidade de anos em que ela colaborou com eles. Era a única mulher em reuniões com mais de 10 pessoas, e sempre se posicionava de maneira efetiva, sem nunca deixar de ser feminina ‘para caber’”, conta, orgulhosa.
Celuta também é reconhecida por sua humanidade e generosidade, qualidades que a tornaram uma mentora admirada por todos que passaram por sua orientação. Seu legado vai além da contribuição científica, deixando marcas profundas na formação ética e profissional de seus alunos e colegas.
Dividindo a mesma sala no laboratório, Daniela foi testemunha de muitas confissões e desabafos de alunos e funcionários que iam até a mesa de Celuta em busca de uma palavra de conforto e consolo.
"A mesa dela era um divã. Ela tinha uma inserção muito grande na vida das pessoas. Não precisava marcar hora, ela sempre estava ali para acolher.”
A formação de recursos humanos foi um marco importante da carreira de Celuta. A docente orientou 34 mestrandos, 27 doutorandos, 13 pós-doutorandos e inúmeros estudantes de iniciação científica, muitos dos quais seguiram carreiras de sucesso em importantes instituições de pesquisa, além de impactarem indiretamente na formação de diversos outros. Um destes alunos foi André Santos, hoje professor do IMPG. Nos anos 1990, ele fez iniciação científica em um laboratório coordenado pela docente, testemunhando de perto a força com que ela atuava. Para ele, a maior lição que aprendeu com Celuta foi cultivar o espírito de liderança e acreditar na força da colaboração.
“O laboratório era um espaço dinâmico, sempre movimentado por pessoas que buscavam a sabedoria e a ajuda de Celuta em diversas questões. Com sua calma e maturidade, ela aconselhava a todos, transmitindo segurança e conforto. Sua presença era um porto seguro, e sua liderança sábia criava um ambiente acolhedor e estimulante. Apesar de sempre atenta às nossas necessidades, Celuta também nos oferecia liberdade criativa, incentivando-nos a ousar e explorar novas ideias”, lembra.
Sua liderança no laboratório é descrita por seus ex-alunos e colegas como inspiradora, com destaque para sua habilidade em cultivar um ambiente colaborativo, estimulante e acolhedor. Para Luciana, Celuta "é uma unanimidade na docência e na pesquisa científica", sendo um dos pilares da excelência do Instituto.
“Além de sua exímia educação e gentileza, nos ensinou elegância e respeito no trato pessoal e profissional, empatia, carisma, entusiasmo, alegria e disposição contagiantes, esperança nos momentos mais difíceis. Bastariam essas qualidades para entendermos o quanto décadas de convívio com a professora Celuta colocaram sua marca em nossos corações. Mas não posso deixar de me pronunciar a respeito de sua grandeza profissional e científico-acadêmica. Essas qualidades foram suas ferramentas transformadoras da carreira de docentes, discentes e servidores técnico-administrativos que tiveram a honra de conviver estreitamente e trabalhar com ela”, se emociona a diretora.
Daniela se orgulha por ter tido a oportunidade, ainda durante o período à frente do departamento, de chefiar Celuta e ser uma das responsáveis pela abertura do processo que garantiu o título de professora emérita a sua mãe.
“Celuta não gostava de tirar foto, não gostava de festa para ela. Foi muito difícil conseguir que ela aceitasse o processo, ela não queria e eu fiquei em uma posição complicada muitas vezes. Sempre defendi que ela merecia. Quando saiu o resultado, ela ficou orgulhosa, mas ressaltando que não queria cerimônias e homenagens. No final, foi como ela quis”, conclui, emocionada.
Confira os outros homenageados da série: